quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Pequeno político – Humberto

Nesta matéria quem tem uma opinião formada sou eu. É fácil ter opinião, mas nem todas as opiniões são adequadas. Uma opinião deve marcar presença, para ser notada, senão de que serviria ter opinião, e ao mesmo tempo não incomodar, e muito menos ofender, para além do estritamente necessário. Não é uma arte fácil, mas aprende-se, o Humberto que o diga. Cedo sentiu a convocação, ainda no secundário, para a associação de estudantes. Porém no início era mais a vontade que a perícia. Humberto abria a boca e lá saía a minha voz desconectada como se de um ato de ventriloquismo se tratasse. Recordo que o Romeu ainda observou com graça, Humberto, pareces um político a falar. Pobre Humberto, não estava à espera, perdeu o controlo e calou-me, começando ele a falar. Disse, pois... pois..., e pior, repetiu o Romeu dizendo, um político. Felizmente lá voltei eu a retomar o controlo e juntei-lhe mais esta matéria, e aquela, e aqueloutra, coisas de orçamentos, gestões, e acima de tudo as regras que nas suas nuances pregam partidas. Mas serviu-lhe de lição. A partir daí percebeu que nada poderia ser inesperado. Pega-se na coisa, seja ela uma pergunta ou um mero comentário, e começa-se a fiar, criando um novelo que vai embrulhando o que não interessa, deixando de fora a mensagem, saliente e luzidia. Essa é a regra principal que a todos recomendo, se não há uma mensagem mais vale estar calado. Nas reuniões identificamos facilmente os que falam porque gostam de se ouvir, ou pior, porque acreditam piamente no que dizem, daqueles que pragmaticamente dizem o que é necessário para atingir os seus objetivos. Por isso a mensagem não deve conter a verdade, como julgam os crédulos, mas sim o que é útil. Nisso, mesmo enquanto aprendiz e inábil, Humberto nunca esteve com os primeiros, sabia claramente que o jogo bonito e vistoso pode encher o olho, mas não traz vitórias tranquilas, daquelas que perduram. Esta é a segunda verdade que podeis aprender do pequeno político que está dentro do Humberto, a vitória a que deveis almejar é a de secretaria. Às vitórias de que não se percebe a origem não é fácil achar o fim. Não foi sempre um aprendiz o Humberto. No início ainda falava a duas vozes, daí a observação de Romeu, e eu andava um pouco aos trambolhões lá dentro, pronto para responder à chamada sempre que Humberto queria dar um a opinião, marcar uma diferença, enfim, marcar a posição. Com o tempo deixámos de ser dois e já não se percebia quando falava um ou o outro. Digamos que é isso o crescimento, moldarmo-nos por dentro com fantasias que com o tempo se tornam reais. Existe, contudo, nesse período de folga entre a fantasia e o corpo, uma visível falta de coerência que pode trazer desconforto. No caso de Humberto, o fim do namoro com Catarina não é alheio ao reparo de Romeu. Catarina tinha apenas 15 anos e não ficou indiferente. Humberto ainda tentou. Quase sentiu, ou simulou, o sofrimento da perda, tão normal nos adolescentes. Falou com ela, justificou-se, mas o fascínio nestas idades é puramente mágico, e aqui entre nós, Humberto sentiu um grande alívio.

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