domingo, 28 de outubro de 2012

Os blogues, segundo Fernando Pessoa

Ah, que inveja que eu tenho do blogue seguinte. Tão cheio de ódio, amor ou raiva. Tão certo do que deve ser, ou cheio de vazio e a suplicar que aconteça algo a seguir.

Como me emociono com a verdade que encontro neste blogue e por uns instantes dou-me ao luxo de esquecer que eu sou o que não está lá, o que não a quer encontrar. Ah, que inveja.

Que inveja que eu tenho do teu corpo, que não é o meu e pressinto nesse blogue, um corpo que insinuas cheio de chuva e flores. Um corpo que eu quero para sentir inveja.

Como invejo as cadeiras do relvas e à socapa me sento numa delas. Respiro fundo e permito-me pensar que este reino é meu, até que o autor vem a correr comigo, dizendo que esta cadeira é do relvas, não é minha, que posso sentir inveja, mas não posso estragar o blogue. Ah, que inveja.

Sinto inveja desse teu pequeno poema que ninguém comenta, por inveja. Imagino essas palavras na minha boca. Palavras que a tão enchem que basta mover as mandíbulas para se propagarem como um post num blogue. Que inveja.

E arrasto a inveja de um blogue para o blogue seguinte. E a inveja vai-se partindo aos bocados. Um pouco fica neste blogue, mas tento guardar algo para poder continuar a caminhada. E é um contrassenso isto que andar com a inveja aos pedaços. Ela quer-se forte, junta, sentida. Ai que inveja.

sábado, 27 de outubro de 2012

Central Tejo

O livro de fotografia Central Tejo - Imagens de um Tempo Ausente de António Paixão, com um voltímetro na capa, um amperímetro na contracapa e o volume de um objeto industrial, contém o resultado de uma veneração intemporal, sem medida.

É uma veneração pelos objetos construídos pelo homem que, desprovidos de função ou na sua ignorância, se tornam objeto de culto. Uma veneração feita das mesmas impressões que terá um humano ao chegar a um planeta alienígena, ainda que cheio de vida e em funcionamento.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

como um ovo

como um ovo
de aspeto sólido
arredondado e liso
facilmente se quebra e escorre entre os dedos

também as palavras fortes
diretas e sem adornos
facilmente se rompem e escorrem
como um ovo