sábado, 6 de novembro de 2021

Cuscovihões

desalentados pela ausência de resposta e no automatismo de carregar regadores e flores na ânsia de ter apresentável por fora o que por dentro já lá vai vertem a intensidade da procura a perscrutar os passantes que na sua aleatoriedade trazem novidade àquele espaço eterno ainda que entrecortado por intervalos fechados de algumas dezenas de anos que são as pequenas janelas de agitação de que estes dedicados cuidadores já voluntariamente se excluem mais por teimosia que por usufruto de algum profundo saber que a verdade também chega por camadas cada uma com o seu grau de satisfação da descoberta da relatividade da anterior só que estes ficaram por aqui ajeitando os entes queridos como quem com máxima perícia estaciona na perfeição o seu automóvel num exíguo espaço e agora não se sente com capacidade de dali o retirar quer porque no fim é só mesmo aquilo e agora que se conseguiu este lugar de que vale a pena estar a mexer ou quer porque recomeçar é também uma canseira sobretudo uma canseira por causa da porra da inércia ou quer porque por aqui mais tarde ou mais cedo desfila toda a vida e assim se assegura desde logo um bom assento na bancada para apreciar o anunciado espetáculo que nunca os irá defraudar ou quer porque dado o elevado preço da viagem se comprou um bem mais acessível lote de bilhetes só de ida ainda que adquiridos à pressa na irreflexão da emergência mas uma vez aqui o hábito faz o monge e vive-se da comparação silenciosa de trocas de olhares em que pelo menos se garante que o teu não é maior que o meu ou quer porque se ganhou um gosto pela jardinagem como manifestação de irrevelado perfecionismo no manuseamento do regador que na vida nunca se deve ficar parado e as rotinas ajudam ao passar das horas ou quer porque o que partiu ainda tinha muita existência em atraso e deixou aos que cá ficam a obrigação do pagamento da pesada dívida de descontar os dias não vividos um a um até somarem o todo em falta e depois poderem partir resgatados ou quer porque aqui se encontrou a paz que alguns parecem ter vindo ao mundo com um turbilhão agarrado aos pés e não há palavras nem razões que os acalmem e se pode agora finalmente falar em conciliação com eles estás a ver não precisava de ter sido assim ou quer porque estão aqui como figurantes da visita do dr. josé galvão psiquiatra ou túmulo do dr. josé galvão advogado aqui colocados pelo grande arquiteto como ambiciosos candidatos a atores tão cheios por dentro mas com papéis bem pobres de transparecer para fora cabendo-lhes apenas a missão de mostrar a pequena curiosidade de saber quem é aquele identificando-o não por quem é mas por quem visita já que estão convencidos que é essa a única fidedigna morada e por isso um comanda o outro com os olhos segue-o vê quem vai honrar e o mandado segue zé em pequenos passos disfarçados regador descaído na mão como um detalhe de personagem que o enche de orgulho mas em que ninguém repara é na campa do dr. josé galvão advogado e este homem magro careca macerado só pode ser o seu neto