O filme Linha Vermelha de José Filipe Costa é um filme honesto, não porque o Cinema seja necessariamente honesto, mas porque o realizador o é. É um documentário sobre o filme Torre Bela de Thomas Harlan, que relata a ocupação de uma herdade no Ribatejo em 1975. O documentário mostra como a presença da câmara de filmar desencadeia acontecimentos e como Thomas Harlan a usa para manipular a realidade. Ainda assim, como a manipulação necessita de se alimentar da realidade para ser verosímil e a passagem do tempo torna a manipulação quase anedótica, fica muito para ver.
Vê-se o dono da herdade no seu palácio (era assim que os trabalhadores viam a casa da herdade) dizer, com um Francês distinto, não saber de onde vinham os trabalhadores da herdade. Veem-se os trabalhadores, com um ar infantil a olhar boquiabertos para o palácio. Era este o Portugal de antes do 25 de Abril. Linha vermelha segue o percurso dos ocupantes até aos dias de hoje e percebe-se que já não olham boquiabertos para o palácio. Contudo não segue o percurso do dono da herdade pelo que ficamos sem saber se o resultado de perder o seu palácio foi ter-se fechado noutros palácios, mais ou menos virtuais, limitado a saber do que ocorre lá fora através da mediação de Rasputines.
Na França, em 1789, quem tinha o poder vivia fechado num palácio chamado Versailles e tinha pouca consciência do que acontecia na sua herdade chamada França. Foi preciso uma revolução para deixar de haver um Rei da França e passar a haver um Rei dos Franceses. Contudo, não deixa de ser curioso que a verdadeira revolução aconteceu alguns milhares de quilómetros para oeste, com a independência dos Estados Unidos.
Neste momento de crise começam a resurgir os desígnios que ultrapassam a dimensão das pessoas. É Portugal, é a Nação, e deixa de ser os Portugueses. O sacrifício das pessoas é pedido a bem destes desígnios pintados de abstrato. Contudo a História ensina-nos que eles nunca têm nada de abstrato e são de fato os desígnios de alguns.
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